Expresso

Como alguns peixes escolhem a hora de nascer

Pedro Bardini

19 de dezembro de 2024(atualizado 19/12/2024 às 14h35)

Pesquisa recente revelou pela primeira vez o hormônio responsável pela eclosão do embrião no ovo. Momento exato também depende de condições externas

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FOTO: Thierry Marysael/Flickrdois peixes na água

peixes-zebras, uma das espécies analisadas no estudo recém publicado

Há um consenso científico de que algumas espécies ovíparas, isto é, que botam ovos, conseguem decidir o momento de seu nascimento. O mecanismo por trás desse fenômeno, no entanto, só foi descoberto em 2024, por uma equipe de cientistas da Universidade Hebraica de Jerusalém.

A equipe analisou os hormônios presentes em embriões de duas espécies de peixe, e revelou que o momento de eclosão dos ovos está diretamente relacionado com as condições do habitat.

Os resultados, que impactam os estudos da evolução, foram publicados em 5 de dezembro na revista acadêmica Science. Segundo os autores do artigo, o mecanismo responsável pela eclosão é conservado evolutivamente há, pelo menos, 200 milhões de anos.

As espécies

O momento da eclosão, ou do nascimento, é crucial para todas as espécies que colocam ovos. A sobrevivência desses animais depende de condições quase perfeitas, tanto dentro do ovo, quanto fora – o que implica que o animal capture algum sinal do habitat, avaliando o melhor momento para nascer.

No caso dos peixes-zebras, uma das espécies analisadas pelos pesquisadores de Jerusalém, as condições perfeitas estão relacionadas à luz solar. Evolutivamente, os embriões dessa espécie tendem a nascer nas primeiras horas do dia.

Quando peixes-zebras saem do ovo cedo demais, e, portanto, com má formação, ou mesmo quando saem tarde demais, normalmente morrem antes daqueles embriões que conseguiram escolher o momento nas condições perfeitas para nascer.

A outra espécie analisada pelos pesquisadores foi a medaka-japonês, também conhecida como peixe-arroz japonês. Através de análises, os cientistas chegaram a um mecanismo neuronal em comum às espécies, responsável por controlar a eclosão de ovos não só dos peixes-zebras e medakas-japoneses, mas da maior parte das espécies de peixes.

FOTO: Divulgação/Dr. Deodatta Gajbhiye da Universidade Hebraica de Jerusalémembrião de peixe visto no microscópio

Embrião de peixe-zebra

O mecanismo

O mecanismo neuronal que dá aos peixes autonomia para decidir quando vão nascer é um neuro-hormônio chamado TRH (hormônio liberador de tireotropina). A descoberta inédita foi revelada pelo estudo recém publicado na Science.

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Além de regularem funções do organismo como outros hormônios, os neuro-hormônios podem servir como neurotransmissores. É o caso do TRH no momento de nascimento dos peixes. 

De acordo com os autores do artigo, no início do processo de nascimento das espécies, um sinal associado ao hormônio TRH é enviado pelo cérebro. Assim, o hormônio viaja pela corrente sanguínea até uma glândula específica que libera enzimas responsáveis por dissolver a parede do ovo, libertando o embrião.

A equipe também concluiu que a ausência do TRH impede a ativação das enzimas embrionárias responsáveis por romper as membranas do ovo, resultando na morte do embrião dentro da estrutura.

Evolução

A descoberta do TRH no mecanismo neural de espécies de peixes demonstra como os embriões, longe de serem passivos, possuem a capacidade de controlar ativamente seu processo de eclosão. 

Esse fenômeno é uma chave para sua sobrevivência há mais de 200 milhões de anos, quando os peixes-zebras e os medakas-japoneses se separaram evolutivamente, já decidindo o momento que iriam nascer.

As conclusões do estudo têm implicações evolutivas significativas, pois revelam o mecanismo neuronal que controla a eclosão no maior grupo de vertebrados (peixes, anfíbios, répteis, aves) vivos. Além disso, o artigo dá oportunidade para que próximas pesquisas explorem a relação entre neurobiologia e adaptação ambiental e evolução.

No futuro, os pesquisadores da Universidade Hebraica de Jerusalém planejam explorar como o TRH e outros fatores neurais e hormonais influenciam a eclosão em outras espécies. De acordo com eles, há uma hipótese de que este mesmo hormônio esteja relacionado com o momento de nascimento e com a tomada de decisão de outros grupos de animais.

Devido às semelhanças genéticas e fisiológicas com os humanos, o peixe-zebra tem se destacado como um modelo animal relevante para a pesquisa científica, inclusive nos estudos evolutivos. Pesquisas com essa espécie já contribuíram significativamente para a compreensão de mecanismos biológicos complexos, como o funcionamento cardíaco e sua evolução ao longo do tempo.

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