Por que queimadas são problema recorrente na Amazônia
Suzana Souza e Aline Pellegrini
29 de agosto de 2024(atualizado 04/09/2024 às 22h16)Amazônia bate o recorde de 2024 para focos de incêndio em 24 horas. Problema é agravado pela seca histórica que atingiu região
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A Amazônia bateu o recorde de 2024 para focos de fogo em 24 horas entre a terça-feira (27) e a quarta-feira (28). Segundo o monitoramento do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), foram 2.433 ocorrências de incêndio no período. O Durma com Essa desta quinta (29) explica como está a situação do fogo na Amazônia nesta temporada de seca. O episódio tem também Isadora Rupp falando sobre particularidades das eleições municipais de 2024.
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Edição de áudio Brunno Bimbati
Produção de arte Lucas Neopmann
Transcrição do episódio
Suzana: Um quadro de destruição na floresta amazônica que tem se mostrado pior do que o projetado. Uma situação que mistura a seca histórica na região com o fogo, fazendo os incêndios se espalharem mais rapidamente. Um período anualmente monitorado, mas que dessa vez chegou mais cedo, com dúvidas se terminará mais cedo também, ou se seguirá causando estragos. Eu sou a Suzana Souza e este é o Durma com Essa, o podcast de notícias do Nexo.
Aline: Olá, eu sou Aline Pellegrini e tô aqui com a Suzana pra apresentar este podcast que vai ao ar de segunda a sexta, todo começo de noite, sempre com notícias que podem continuar a ecoar por aí.
[trilha de abertura]
Suzana: Quinta-feira, 29 de agosto de 2024. Dia seguinte ao recorde do ano de focos de queimada em 24 horas na Amazônia. Entre as 21 horas da terça-feira e as 20 horas e 59 minutos da quarta-feira foram registrados 2.433 focos de calor na floresta amazônica. Os dados revelados pelo colunista do UOL Carlos Madeiro são do Inpe, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, que faz o monitoramento das queimadas no país.
Aline: Pra você entender o tamanho da destruição, o número registrado agora é maior do que a quantidade de focos de incêndios do dia 11 de agosto de 2019, que ficou conhecido como “O Dia do Fogo”. Há cinco anos, eram cerca de 100 incêndios a menos do que o aferido entre essa terça e quarta-feira.
Suzana: Aqui vale a gente lembrar o que foi o dia do fogo. A data ficou marcada por uma série de incêndios criminosos no Pará. Uma investigação da Polícia Federal apurou que houve combinação, entre criminosos, para a realização de incêndios em cidades como Altamira e Novo Progresso. Os efeitos do fogo foram sentidos em diversos estados do país, já que a fumaça densa se espalhou.
Aline: Em entrevista à coluna de Madeiro no UOL, a Helga Correa, que é especialista em conservação do WWF-Brasil, ressaltou que o problema de 2024 se difere do de 2019 porque a situação da floresta amazônica hoje é de seca histórica. Abre aspas pra ela: “Quando olhamos anos precedentes, 2023 teve uma seca grande na Amazônia e, quando começa o ano de 2024, os rios não retomaram os níveis de normalidade. Agora a gente se aproxima dessa época seca, e temos esse aumento de queimadas. Isso é muito preocupante.”
Suzana: A quantidade de incêndios na região começou a crescer nos últimos dias de julho, atingindo o pico neste mês de agosto. A quantidade de focos de calor registrados na Amazônia Legal em todo o ano é a maior em 17 anos, também segundo dados do Inpe. Quando se consideram os números apenas do mês de agosto, o valor registrado em 2024 é 125% maior que o identificado em 2023. Aqui é bom lembrar que a Amazônia Legal compreende nove estados: Acre, Amapá, Amazonas, Maranhão, Mato Grosso, Rondônia, Roraima, Pará e Tocantins.
Aline: A maior parte dos focos do mês de agosto está concentrada em três estados: Mato Grosso, Pará e Amazonas. O fogo ocorre principalmente no sul do estado do Amazonas e nos arredores da rodovia Transamazônica, segundo o governo federal.
Suzana: As queimadas são um problema recorrente da Amazônia, com maior número de focos de calor na sua estação seca, entre os meses de agosto e outubro, com pico em setembro. E a preocupação é justamente que o mês previsto pra esse pico ainda nem chegou.
[mudança de trilha]
Aline: A queimada é uma técnica que busca limpar áreas para o plantio de lavouras e pastagens e pode também ser usada após o desmatamento. Segundo o governo federal, os incêndios florestais registrados na Amazônia são em maior parte associados a essas atividades. Como a gente disse, o fogo costuma se destacar em épocas de seca, como a de agora, porque a baixa umidade do ar favorece sua dispersão.
Suzana: E aqui tem um fator interessante. As queimadas crescem na Amazônia ao mesmo tempo em que o desmatamento cai. Dados do Deter, o sistema do Inpe que indica a tendência da taxa anual de desmatamento, mostram que os alertas de devastação caíram mais de 45% de agosto de 2023 a julho de 2024 em comparação com os 12 meses anteriores. A área sob alertas de desmate foi a menor da série histórica iniciada em 2016.
Aline: O quadro revela uma aparente contradição. Pesquisadores explicam, no entanto, que as queimadas aumentam enquanto o desmate cai porque, apesar da redução, o corte de vegetação ainda existe na Amazônia. Além disso, parte das áreas queimadas em 2024 já tinham sido desmatadas há mais tempo, por isso não apareceram nos alertas de devastação do Inpe dos últimos meses.
Suzana: Em entrevista ao Nexo, a Ana Alencar, que é diretora de ciência do Ipam, o Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia, explicou o seguinte: “Quando olhamos o que está queimando, há muitas áreas de pastagens. Mesmo com o desmatamento menor, se as pessoas continuarem usando o fogo em larga escala para manejarem suas pastagens, a chance de esse fogo escapar e virar incêndio aumenta muito em uma condição como a que estamos vivendo. Um grande estresse hídrico e uma paisagem altamente inflamável”
Aline: Nessa última semana de agosto, a fumaça gerada na Amazônia atingiu pelo menos outros dez estados, entre eles Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Mato Grosso e São Paulo. Assim como aconteceu lá no dia do fogo de 2019, a explicação está nas massas de ar que se deslocam do Norte ao Sul do Brasil. Essas correntes costumam transportar ar quente entre as regiões. Quando tem incêndios na Amazônia, essas massas de ar acabam carregando a fumaça, formando um “rio atmosférico” de poluição que percorre todo o país.
Suzana: O processo é análogo ao dos chamados rios voadores, que transportam umidade da Amazônia para o Centro-Sul do Brasil. Essas massas carregadas de vapor d’água acompanham nuvens e formam chuva quando há condições meteorológicas propícias. É por causa delas que o clima no Centro-Sul tem características tropicais, contrariando sua tendência para a aridez, como é registrado em outras áreas da mesma latitude no Hemisfério Sul, entre elas a Savana africana.
Aline: A fumaça que tem atingido até o extremo sul do país vem tanto da Amazônia quanto de outros lugares que têm registrado queimadas, como o Pantanal e países vizinhos, segundo a MetSul. A maior parte dessa poluição, no entanto, se origina de focos na Bolívia e no sul da Amazônia brasileira.
Suzana: Assim como parece ocorrer na Amazônia, a temporada de fogo do Pantanal começou em 2024 mais cedo que o comum. O fenômeno climático El Niño, que durou de 2023 a meados de 2024, e a mudança climática estão entre as razões para a atual seca no bioma. O que favorece o espraiamento de incêndios. Quase 9% da região já foi queimada neste ano, segundo dados divulgados no começo de agosto pelo Laboratório de Aplicações de Satélites Ambientais da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Aline: E além da Amazônia e do Pantanal, a gente também viu incêndios se espalharem por São Paulo nesse fim de agosto. Pelo menos duas pessoas morreram por causa das chamas no estado. Os governos federal e paulista apuram suspeitas de incêndio criminoso.
[mudança de trilha]
Suzana: No combate aos focos de incêndio na Amazônia, o governo federal diz ter mais de mil e quatrocentos brigadistas do Ibama e do ICMBio, o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade. Os agentes atuam prioritariamente em áreas federais, como terras indígenas, unidades de conservação e assentamentos. Também apoiam o combate ao fogo em outras áreas, onde a ação é responsabilidade prioritária dos estados.
Aline: As ações do governo contra a estiagem e os incêndios são coordenadas por uma sala de situação criada em junho. O Executivo articula a resposta com os governos estaduais e representantes dos Corpos de Bombeiros da região Norte. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva também sancionou em julho o projeto de lei que regulamenta o chamado manejo integrado do fogo para prevenir e combater incêndios florestais.
Suzana: Ainda não é certo como será o próximo mês de setembro, quando costuma ocorrer o pico de queimadas na Amazônia. Pesquisadores dizem não saber se a temporada de fogo apenas começou mais cedo — ou seja, também deve terminar mais cedo. Ana Alencar, diretora de ciência do Ipam, falou o seguinte pro Nexo: “Infelizmente, ainda não chegamos no pico da estação seca e temos sinais não muito animadores sobre o que ainda está por vir. Temos os rios e o ar cada vez mais secos, altas temperaturas e condições muito propícias para o fogo”
Aline: O Durma com Essa volta já
[trilha da redação]
Aline: As eleições municipais estão marcadas para o dia 6 de outubro e a Isadora Rupp escreveu sobre algumas particularidades do pleito de 2024. Isadora, primeiro conta pra gente como funciona a eleição em municípios que só tem um candidato?
Isadora: A eleição de 2024 é recordista em candidatos únicos concorrendo à prefeitura desde 2000, quando o Tribunal Superior Eleitoral iniciou a série histórica desses números: em 214 cidades do país, os eleitores não têm como escolher entre dois ou mais candidatos. O perfil desse candidato único no pleito de outubro de 2024 é formado majoritariamente por homens brancos, com idade média de 49 anos. Em 72% das cidades, todos eles concorrem à reeleição.
Isadora: No dia do pleito, por mais que seja um único candidato, o nome da pessoa vai para a urna eletrônica, e o eleitor precisa comparecer para confirmar a escolha, além de registrar voto no vereador ou vereadora. Segundo a lei eleitoral, que estabelece as normas para as eleições, é considerado prefeito o candidato que obtiver a maioria dos votos válidos. Por isso, no caso dos candidatos únicos, é só a pessoa que está concorrendo à prefeitura votar em si mesma. Lembrando que a Constituição de 1988 e a lei eleitoral consideram como votos válidos apenas votos nominais e de legenda, e determinam a exclusão de votos brancos e nulos para os cargos de prefeito, governador, e presidente.
Aline: E Isadora, tem uma cidade que terá sua primeira eleição agora em 2024, né?
Isadora: Isso, essa cidade é Boa Esperança do Norte, no Mato Grosso do Sul, que tem o agronegócio como a sua principal atividade econômica e se tornou oficialmente um município em outubro de 2023, depois de uma decisão do Supremo Tribunal Federal que validou a lei que criou a cidade lá nos anos 2000. Só que houve uma batalha jurídica enorme pela formação do município, que se estendeu por décadas.
Isadora: Agora, com a oficialização, Boa Esperança do Norte, que era distrito da cidade de Sorriso e era administrada por uma subprefeitura, vai fazer o seu primeiro pleito para eleger prefeito, vice-prefeito e nove vereadores. A cidade, de sete mil habitantes, tem quatro mil eleitores aptos a votar, que vão escolher entre dois candidatos, ambos filiados a partidos de direita. Quarenta e nove pessoas disputam as nove vagas para a Câmara Municipal, e a primeira prefeitura de Boa Esperança do Norte começa seus trabalhos em janeiro de 2025.
Aline: Os textos da Isadora você lê em nexojornal.com.br. E um último aviso: os cursos do Nexo estão com novas turmas abertas. Tem curso sobre como fazer e ler gráficos, como escrever textos mais claros e sobre a história e a aplicação das regras das guerras… Entra lá em nexojornal.com.br/cursos pra saber mais.
Suzana: Do problema das queimadas na Amazônia às particularidades das eleições de 2024, durma com essa.
Aline: Com roteiro, apresentação e produção de Suzana Souza, apresentação e edição de texto de Aline Pellegrini, roteiro de Mariana Vick, participação de Isadora Rupp, edição de áudio de Brunno Bimbati e produção de arte de Lucas Neopmann, termina aqui mais um Durma com Essa. Amanhã é dia de Extratos da Semana quando a gente traz pra você um resumo das principais notícias dos últimos dias. Até!
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